sexta-feira, 14 de dezembro de 2007
Férias
Estou tirando férias por tempo indeterminado.
Então não esperem atualizações tão cedo.
Para qualquer contato: lucasnicolato@gmail.com
um abraço,
Lucas
terça-feira, 4 de dezembro de 2007
Procura-se compositor
Ou quem queira musicar meus poemas.
Se estiverem interessados, comentem esse post.
quinta-feira, 8 de novembro de 2007
Viaduto do Caju
(ônibus entre dois sonos)
brevemente despertada
pelo ruído atômico
quase com espanto
vê da janela um sonho
e cabe inteira
na gentileza do
intervalo
segunda-feira, 29 de outubro de 2007
Realidade Palpável
a inescapável
possibilidade
dos lábios
Mas a promessa
só é sincera
se a verdade
é adiada
O olho chama
A alma cama
O corpo apenas semente
domingo, 21 de outubro de 2007
Corrida
Minha vida sempre foi simples, ou melhor, sempre foi complicada, mas com complicações previsíveis, rotineiras. Em outras palavras, uma vida simples. Vez por outra o pneu do carro furava, ou algum moleque arranhava a lataria. Já havia sido assaltado duas vezes, número até pequeno na minha profissão. Às vezes brigava com minha esposa, mas sempre voltávamos. Às vezes eu jogava na loteria. Não ganhava nunca.
Era basicamente isso, vida simples. Isso e vagar de carro pela noite, pelas ruas da Zona Sul, esperando um casal de jovens na porta do cinema, ou uma senhora idosa que voltasse da visita aos netos. Às vezes um filhinho de papai cheio de uísque. Uma vez uma loira linda tinha dado sinal. Passei a corrida observando o decote pelo retrovisor. Bati. Foi uma merda. Às vezes quando chegava em casa de madrugada, exausto, ainda tinha disposição para fazer amor com a Carla. Esse tipo de coisa acontecia, vida simples, mas nada como o que aconteceu naquela noite.
Esqueci de falar de uma coisa que acontecia muito, principalmente em Janeiro. Chuva. Muita. Era uma merda maior do que bater por causa de decote de loira linda. Não dava pra andar. Quando começava cedo eu nem saía de casa. Sem corrida. Mas quando ela tava meio fraca eu arriscava, afinal, tinha aluguel pra pagar. Aí eu caia na armadilha, ficava preso no trânsito do Jardim Botânico ou alagado em Botafogo. Não ganhava uma corrida. Naquela noite maldita também estava chovendo, mas a corrida apareceu.
Passei em frente a um lugar desses, que a juventude gosta de freqüentar, onde eles bebem demais pra dirigir e tem medo demais pra andar a pé, onde as corridas são curtas e eu posso voltar rapidinho e pegar mais uma leva de adolescente chato. O problema é quando vomitam. Aí tem que mandar lavar, pagar caro, merda. Sempre discuto quando eles vomitam, fico estressado, a pressão sobe. É uma merda, é pior do que quando chove. Deixa pra lá! Naquela noite ninguém vomitou no meu banco.
A corrida foi de um cara alinhado, todo bem vestido, terno preto. Meio coroa, lá pelos cinqüenta. Sei lá. O importante é que o cara não era um adolescente filho de papai, nem o pai de um deles. Ou talvez fosse, tanto faz. O que é mesmo importante é que eu percebi exatamente o que ele era no momento em que o vi. Não me pergunte como um cara como eu pode reconhecer algo assim. Vai ver eu não sabia. O que eu estou dizendo? Eu sabia, só não quis aceitar o fato. Era só uma corrida, ia acabar rápido. Eu fiquei olhando o sujeito pelo retrovisor, mas ele não tinha decote, nem peitos bonitos que me fizessem salivar, só tinha aquele olhar sinistro, os cabelos grisalhos e um sorrisinho escroto.
Naquela época ainda não tinha esses rádios que avisam a gente das corridas. Se tivesse rádio era capaz de eu conseguir me distrair e levar numa boa. Talvez. Talvez tenha gente que consiga encarar esse tipo de coisa com naturalidade, mas eu fiquei ali, com um olho na pista e outro no sorrisinho, andando de vagar, no meio da chuva.
- Boa noite.
- Boa noite.
- Pra onde?
- Você sabe.
Continuei guiando. Foi aí que o cara resolveu abrir o paletó e tirou um maço de cigarros do bolso. É uma merda quando alguém fuma no carro. Fica o cheiro. Eu sempre fico nervoso quando alguém insiste em fumar no carro. Paro. A pressão sobe. Uma merda. Mas naquela noite eu não falei nada. Eu sabia o que ele era e não queria me meter, só queria acabar a corrida numa boa, pegar meu dinheiro e ir pra casa.
Às vezes penso que eu devia ter falado alguma coisa, parado o carro, deixado a pressão subir. Mas um cara como eu não sabe o que fazer numa situação dessas. O que você faria no meu lugar? É uma merda, mas sei lá. Acho que eu tinha que seguir em frente, acelerar e terminar a corrida. É o que eu sempre faço.
E fiz. Fui dirigindo no meio da água, desanimado com a chuva, nervoso com o sorrisinho e sem querer acreditar no que era aquele cara. Mas acreditando assim mesmo. Eu só queria fingir que não sabia. Minha vida era simples, e eu nunca soube muita coisa. Então segui até ficar parado no trânsito, como sempre acontecia quando chovia. Quem dera ter uma loira gostosa exibindo os seios e os lábios carnudos no banco de trás. Ah! Eu ficaria horas parado na chuva. Delirando. Mas só tinha fumaça pra respirar, e o sorrisinho pra ver. Tentei me distrair com a cruz pendurada no retrovisor, ela balançava pra lá e pra cá. Ainda a mantinha lá, mas não acreditava mais. Não acreditava, mas sabia o que era, sempre soube. Não deu pra distrair grande coisa.
- Vira ali.
- Mas ali não tem saída.
- Vira.
- Tá.
Virei, não queria discutir. Às vezes acho que não devia ter virado. Sei lá, podia ter falado forte. Mas aí a pressão ia subir, eu ia ficar estressado. Ia ser uma merda. E eu não queria discutir. Eu sabia o que ele era. Um cara como eu não sabe como lidar com isso, entende?
Pegamos um atalho e fomos parar no túnel. Atravessei tossindo com a fumaça e vendo o sorrisinho que brilhava no meio da escuridão. Eu sempre atravessava o túnel. Sempre ficava meio nervoso com aquele negócio fechado e escuro. Às vezes eu dava uma volta passando pelo Centro só pra não passar por túnel. Era uma merda. Mas aquela noite eu peguei o túnel e não fiquei nervoso com isso.
Cheguei em casa de madrugada. Ainda tava com disposição pra trepar com a Carla. Às vezes acontecia. Subi e fui pro quarto. O cara do sorrisinho ficou gargalhando enquanto eu fodia bem gostoso aquela vagabunda. Eu sabia o que ele era, sempre soube, e nele eu não deixei de acreditar. Depois que eu me fartei, foi a vez dele. Ele foi na cozinha e pegou uma faca de churrasco. Foi uma merda.
Hoje eu tenho uma vida simples outra vez. Ou melhor, complicada, mas com complicações previsíveis, rotineiras. Ou seja, vida simples. Às vezes os camaradas aqui fazem uma bagunça e queimam uns colchões. Às vezes reclamo, e sempre me arrependo. Às vezes tento sair, mas nunca consigo. É isso, uma vida simples. Isso e me arrastar à noite entre os corpos prensados dos meus colegas de cubículo, ouvindo gargalhadas e vendo o sorrisinho escroto em cada rosto semi-adormecido. Uma vez, veio uma loira linda visitar um colega, e eu fiquei olhando aquele decote. Levei um soco, foi uma merda. Às vezes, enquanto espero minha vez de dormir, de madrugada, ainda sinto saudade de fazer amor com a Carla. Essas coisas acontecem, vida simples. Mas nada como naquela noite.
quarta-feira, 17 de outubro de 2007
Tertúlia
com 6 poetas convidados - no Campus Niterói da Unversidade
Estácio de Sá. O acontecimento propõe-se a apresentar novos
autores ao público universitário.
Eu estarei lá, como parte da organização do evento e dois
dos meus livretos "Fragilidade", contendo textos selecionados
deste blog, serão sorteados à platéia.
A última edição do evento contou com a presença de jovens
talentos como George Orteyga e André Vargas.
Tertúlia
29/10 - 20:20
Universidade Estácio de Sá
Campus Niterói - Bloco B - Sala Multimídia
Rua Eduardo Luiz Gomes, 134 - Centro - Niterói
sexta-feira, 28 de setembro de 2007
Metroblogging Rio
Estou colaborando com o blog "Metroblogging Rio" também.
Vejam meus posts no endereço:
http://rio.metblogs.com
Mas não esqueceri deste aqui. Em breve, novos poemas em verso e prosa.
um abraço,
Lucas
quinta-feira, 27 de setembro de 2007
Laura Loura
Propus-me a contar. Minha mente profundamente libidinosa exige a história de uma mulher linda e trágica. Tentei-me com Lolitas seqüestradas, mas meu lápis não desliza em folhas gastas. Busquei perfumes e enredei-me no ouro de louros cachos. Achei. Laura. Apaixonei-me pelo erre gratuito. Perdi-me no olhar dos dois as verdes. O da esquerda me pisca de leve e quase se fecha. Laura, Laura, Laura. Esqueço-me nas pronúncias até que e o som já não sai de minha boca. Sou apenas papel beijado pelo grafite.
Laura sou eu.
* * *
Nasci antes que a cidade na qual. Altos de montanha friozinho neblina. Ás vezes eu era. Certa vez me fui. Nem pai nem mãe nem avô, que beijei de má vontade e já não. Tenho a pele muito branca e nunca havia visto oceano. O Sol me espiava o tornozelo como se eu fosse mais que um poema. Mas Copacabana. Escondi meus sonhos em lençóis alugados. Pus cordas em meu pescoço. Acordei. Ardia. A Música. Amei.
* * *
Laura L., cantora e compositora, nasceu em agosto de 1980 em uma pequena cidade serrana do estado do Rio de Janeiro. Aos dezessete anos de idade deixou a casa de seus pais para viver na Cidade Maravilhosa, onde começou a trabalhar como camareira, a cursar a faculdade de Comunicação Social e a apresentar-se em bares e casas noturnas. Entre suas composições mais apreciadas pelo público estão: “O meu nome é esse”, “Meu amor distante” e “Tua voz”. Faleceu no último domingo, aos 26 anos, em decorrência de ferimentos sofridos no incêndio criminoso do ônibus em que viajava para sua cidade natal.
* * *
Quando olhei aquilo. Foi ai que. Foi naquela coisa que enxerguei. Ela. E não era. Lágrimas correndo até meus lábios. O pretume não me enganou. Aquele pretume tão preto que parecia o preto do carvão preto. Porque era. Mas ainda queimava alguma brasa branca. Por algum tempo. A Laura era loura como a cerveja que a gente tomava. E eu adorava a doçura da cabeleira dourada. Mas Laura era amarga, mesmo na cara branca feito espuma. E a espuma se desfaz uma hora. A brasa apaga. Tudo finda. Laura loura, que queria ser preta, acabou sendo só cinzas.
* * *
A primeira vez que a vi. Laura. Loura, ali na Lapa, cantando ao lado do lixo. Achei linda. E aquela voz. Na voz eu via meu vazio. Mas ela me enchia, me achava, me inchava o ego quando me elogiava. Eu explodia com seu canto. Mas quando ela gozava, eu não gostava do grito. Saiu de minha casa, e ainda morou na gaveta da escrivaninha, onde eu lia e relia, e ela era só minha. Até que.
* * *
E se ela ler a notícia? Vai continuar a vida, tudo igual, fingir que não é com ela? Ou se vinga, olho por olho, me mata, joga no lixo, me usa pra limpar merda de bicho? Laura loura queria ser preta, mas eu a deixei marrom. Na imprensa. E ela nem pensa em me procurar.
* * *
Tragédia Carioca: ex-namorado chifrado põe fogo em ônibus e mata cantora. Há testemunhas, mas eu matei todas. Não. Eu sou todas. Eu sou Laura. Sou linda. Sou o filho da puta do ex-namorado. Podem me prender. Não. Tenho direitos. Não à noite. Tenho o direito de botar fogo nesse apartamento. Eu quero ser preta, mais preta que aquela voz linda. Quero ser negra igual ao carvão. Quero o amarelo do fogo nos meus cabelos. Quero ser rubro-negro. Branco azedo.
Mas Laura, a essa altura, deve trabalhar em um Cassino em Nevada e nunca saberá como morremos.
* * *
Só eu que vi. E só vejo o que quero. Madrugada. Só eu naquele lugarzinho. Ouvindo o grito. O cabelo preto ficou amarelo igual ao dela. Da Laura. Só que cheirava mal. Mas chorei de emoção assim mesmo. Ninguém vai querer saber de nada. Ninguém acredita em acidentes. Só eu que vi. E todo mundo só vai ver o que eu quero. E preto não tem nome.
* * *
Sou só papel beijado pelo grafite. Rasgo negro aderindo ao branco. Eu morava dentro daquela gaveta. Ás vezes abria pra me olhar de perto. E via que era ela. Até que. Assisti a gente queimando na lixeira do escritório. O amarelo brilhante ao redor do nosso abraço retorcido e apertado. O branco beijado pelo lábio vermelho. Até que não havia limite entre a letra e a pele.
Foi ai que. Foi naquela coisa que enxerguei. A Laura jogada no chão. No papel sujo. Pisada, usada pra limpar, embrulhar, queimar. Habitando os becos e as piores bocas. Só assim posso salvá-la. Libertá-la. Só se eu queimar nossos corpos no povo.
* * *
Laura, Laura, Laura. Repete-se, com pequenas variações, até o desespero. Nunca amaria uma mulher sem a letra ele. Ele sou eu.
* * *
Acabei indo. Nem disse. Só pra ele. Contei da partida no pedaço de papel. Adivinhei dúvidas. Então, diz que morri. Cresci antes que a cidade na qual. Renasci antes que ela morresse. Cantando ao lado do lixo. O olhar fixo no rapaz assustado. Sempre esqueço depois de lembrar que.
Dia desses li nossa morte. Ele cumpriu. Li e calei. E sorri. Nem pai, nem mãe, nem avô, nem ex-namorado. Nem polícia. E a notícia distante, feito o fogo brilhante, escureceu minha pele. Arde. Arte em minhas veias. Sereia que sou. Só canto. E o corpo impossível. Aqui não sou mais que um poema. Invisível. Nunca quis ser loura, nem Laura. Nem preta. Não sobraram cordas. Nada mais me ata. Só ele é que era nós.
sexta-feira, 3 de agosto de 2007
Livre
arranha, se esfrega,
se entranha
na minha vida,
mas lambe a pata,
esquecida, e nega:
dorme quase sozinha
no nosso abraço
sem nome.
segunda-feira, 30 de julho de 2007
terça-feira, 24 de julho de 2007
segunda-feira, 16 de julho de 2007
Restos
me reclama
como pode
me morde
a orelha
e saboreia
o fato raro
daquele espaço:
sou rato:
rôo ruidosamente o que calo
quarta-feira, 11 de julho de 2007
Proteu
corpo tem
essa onda que
dá em mim
e os dois tem
sal e brisa
suave, e uns
fósseis de seres
que habitaram
antes e essas coisas
pequenas que eu
não sei o nome
O mar e o teu
corpo são
calmos, só
se agitam nas
tempestades
quando me afogam
e os dois tem
a areia quente
ao redor, e me
dão vontade
de cerveja gelada
à sombra de
qualquer um
O mar e o teu
corpo são
tão iguais
que sei que não
podem existir
a não ser na
música distante
que soa através da
concha de onde
nunca saí
quinta-feira, 5 de julho de 2007
Maclaba
Cheguei no final da tarde. O poente solidário ao vermelho da terra. Procurei o hotel. Ruim. Lembrou-me da minha primeira trepada. Não, só do motel. Do resto esqueci. Esqueci de comer. Liguei pra Cláudia, estou com saudade. Saí, andei um pouco pela rua. Lembrei. O segredo. Olhei nos olhos da velha varrendo a calçada. Descalcei os sapatos, deitei. Lembrei de comer. Lembrei da puta da primeira vez. Tive algumas dúvidas a respeito do meu trabalho no dia seguinte, e liguei para o escritório. Fechei a pasta. Tirei a roupa. O banho frio. Finalmente lembrei. O segredo. Sonhei com a velha da calçada. O sorriso. O rosto surrado. A vassoura gasta. A pasta de documentos. A massa do hotel. A merda da vida. O sorriso. O segredo. O céu vermelho. Os olhos vermelhos. O pesadelo. O sangue. A mata. A larva. Acaba! Maclaba: nunca deve ser dito.
Os únicos que não pude largar foram o tabaco e umas doses de vez em quando. Como o sol ainda não tinha nascido, fiquei. Goles e fumaça. Olhei pela primeira vez a montanha. A mata. A noite. O segredo. Lembrei da mulata da primeira vez. Lembrei da onda. Cannabis Sativa. Na praia. De manhã. A noite mal dormida. O vermelho dos olhos solidário ao chão. A Prefeitura. Fiz o meu trabalho como pude até a hora do almoço. Algo me perturbava. O segredo. Saí. Procurei nos olhos dos pedestres. Não os achei solidários. O sorriso das crianças. Eles não sabiam. Mas podiam notar. A Cláudia. A comida. A cerveja. O cigarro. Mais trabalho. Os funcionários me olhavam nervosos. Nunca tive pena. As contas, por favor. A propina. Os olhos vermelhos. Saí. A noite. A mata. Queria ir direto pro quarto, dormir. Mas a velha não tirava os olhos de mim. Nem varria mais. O sorriso se mexia. A mão trêmula. A lágrima. O pavor. Adormeci com a imagem. O segredo. Os lábios. Os livros. Os velhos. Eu que havia muito não lia nem acreditava. Vagava sem sono. Como a velha da calçada. Lembrei. A montanha. O murmúrio. As letras. As sílabas. A mágica. Calada. Maclaba: nunca deve ser dito.
Toda manhã tinha merda de cavalo na frente do hotel. As larvas me incomodavam. Lembravam-me. O segredo. E moscas rodeavam meu caminho. O sol forte. A pele já solidária ao vermelho do pó. Saía cedo. O trabalho. Os funcionários já davam tapinhas em minhas costas. As crianças pararam de sorrir. O almoço. A cerveja. O cigarro. Sempre. Passava muito tempo na biblioteca. Procurava. O segredo. A saída. Lisérgico. Consegui quem me desse. As sílabas andavam em minha boca. O monte de bosta no hotel. A larva. A montanha. Todo dia eu olhava nos olhos da velha. Os séculos. O murmúrio. Agora ela já tinha esperança. Mal dormia. Apenas sonhava. O cheiro do hotel lembrava aquela minha tia. A primeira vez que fui a um cemitério. Lembrava o motel. A mulata. A puta. A punheta. A tragada. A viagem. O banho frio. Frases antigas. A chave. A Cláudia. A Morte. Maclaba: nunca deve ser dito.
Só entendi que era o dia do meu aniversário muito depois que a Cláudia chegou com o bolo. É nessa espelunca que você tem vivido? Percebi que já era tempo. Ela resmungou sobre a barba. Olhou estranho. Peguei a bebida. Ofereci. Tinha algo mais ali. Lisérgico. Saímos caminhando entre as sílabas mágicas. Ela nem notou a merda. Nem a larva. O segredo. A velha sorrindo em aprovação. Tinha a mesma cara da puta da primeira vez. Não, era a cara da tia. E ela nem era mulata. Nos seguiu. O alto. A montanha. A mata. A larva caminhando entre as cascas. A cruz retorcida. O poente solidário ao sangue. O sexo. O quase orgasmo no sorriso da velha. A Cláudia. O segredo. As palavras. O murmúrio. A coisa que saía dos poros. A larva renegando a casca. Os espinhos. Meus dedos. Os dentes. O poente desaparecendo. Algo nasce. O sangue. O sabor. O horror. Vermelho. A morte. Acaba! Vermelho. Acaba! Maclaba: só eu pude ouvir o grito.
Não costumo mais ir à biblioteca. Cansei de procurar. O segredo. Não desisti. Apenas sei. Não ligo mais pra merda na frente do hotel. Não há saída. Ninguém mais me olha nos olhos ao voltar pra casa. Os funcionários sorriem. As crianças me evitam. Nunca esqueço de comer. O sangue. A propina. As meninas. Não há mais lisérgico. Nem penso na larva. O vermelho da terra é solidário aos meus crimes. O sorriso. O sabor. Não preciso mais da velha. Tenho meus séculos. Não durmo. Nem sonho. Não serei como ela. Não esperarei um estranho. Gosto da cidadezinha. O abismo. Lembra-me a primeira vez que ouvi as palavras. O segredo. A montanha. A mata. O murmúrio. Não sairei. Mudei as sílabas antigas. As letras caladas. O som. A morte. O vermelho. A mágica não acaba. Maclaba: nunca mais será dito.
domingo, 24 de junho de 2007
Beautiful Girl Reading Bukowski (para cris e beta)
horas da manhã
ela sorri e
derrama palavras
como se
todas as noites
terminassem com
o sol.
e não sinto
em que dias ou
horas, mas sei
que às vezes
até é verdade.
fica
mais um beijo
nem vejo onde começou
mas acaba sendo como antes
toda vez que cismo em ficar
até depois de partir e chegar de novo
(eu outro)
na mesma vocês
sábado, 23 de junho de 2007
A última imagem
espelho quebrou-se
como a promessa
dizem que dá azar
não sei, mas na imagem assim
partida
enxergo melhor a sua
como a voz distante
passada
ao vidro frio
pela cor do beijo
quarta-feira, 20 de junho de 2007
Timidez
Olhares. Espelhos. Vermelhos. Lábios. Rios.
Ainda ondulo na pista em que a vi.
Ela me beija como se não fosse profundo.
Pés. Pernas. Guerras. Sussuros. Gritos.
Ainda há barulho pra abraçar por aí.
Ela se ajeita como se não fosse escuro.
Amor. Pavor. Paladar. Indicios. Vicios.
Ainda a espero, mas ela apenas sorri.
domingo, 10 de junho de 2007
Eu te amo (em homenagem ao dia que ainda não é hoje)
Quando nos vimos
sorrimos, e o primeiro feitiço
lançou-se entre o beijo e o calor
o amor era só um desejo
e o desejo era mais que o amor
Quando sentimos
queremos, e a sentença
nos uniu, apesar da dor
o amor era só uma esperança
era mais esperança que amor
Quando partimos
partiu-se a realidade
e nem amizade sobrou
o amor é só uma saudade
e a saudade é maior que o amor
Quando canto, reato
mais do que rompo, o encanto.
pois nessa voz escrava que escuto
o amor é só uma palavra,
mas a palavra é maior que tudo.
sábado, 2 de junho de 2007
Reminiscências
Tocava meu pai no bandolim.
Perdi meu pai.
O bandolim ainda tenho,
intocado.
Só a música continua exatamente a mesma:
Dilim! Dilim! Dilim!
E agora toca dentro de mim.
sexta-feira, 1 de junho de 2007
Inspiração
Acorrentaram-me aos lábios
Os mais belos poemas.
Não os posso falar.
Soariam falsos.
Para isso vivo:
As lágrimas corroem lentamente cada grilhão.
quarta-feira, 30 de maio de 2007
Essa Pessoa (letra aguardando melodia)
o que quer
nem eu sei
mas eu sei:
se é amor
vai doer
nela existe
algo triste
sem saber
que viver
é amar
é sofrer
finge que tudo é lindo
esconde o choro sorrindo
essa pessoa sem pudor
cala a própria beleza
fingindo não ter tristeza
vai fugindo do meu amor
segunda-feira, 28 de maio de 2007
Poesia do Rock
mente mais do que sente
em frente enfrenta dor
e até amor, de repente
O Poeta é engenheiro
projeta, e então injeta
tesão no corpo inteiro
luz traiçoeira, incerta
Há dez mil anos lancei meu grito
que em vão desde então
corre o infinito:
Eu existo! Eu existo! Eu existo!
E a poesia do Rock
é só isto:
uma paixão, um choque, um mito.
sábado, 26 de maio de 2007
A primeira letra
Abertos e certos
Apertos e prantos
Acertos e abortos
Acordos e outros
Acasos e tantos
Amados encantos
Acesos e pronto.
quarta-feira, 23 de maio de 2007
Fotos do Sarau
domingo, 20 de maio de 2007
Sarau na UNESA Niterói
Trabalho
O sol brilhando lá fora é belo.
O bem-te-vi cantando lá fora é belo.
Até a fumaça venenosa lá fora é bela.
Ah! Se fosse eu que a fumaça tossisse.
Se o bem-te-vi me pronunciasse.
Se o Sol,
Em raiozinhos ridículos,
Pudesse ler estas linhas! Ah!
Mas não.
Só eu é que leio.
E amplio solidões
para o Deus respirar.
Barca
Páginas abertas.
Deus! Pra que tanta notícia,
Se eu posso inventar inutilidades que conquistarão o mundo?
Desperdiço cuidadosamente cada segundo da travessia.
Eu sou a barca que nunca atraca.
Enfim.
A espera me chega.
Mau Poeta
Nunca consegui ouvir estrelas.
Por mais que aguçasse meus ouvidos,
nunca captei o mais leve som.
Mesmo a maior constelação
e o Luar brilhante
não disseram-me nada quando os indaguei.
Talvez eu seja surdo.
Talvez tenha sido o som dos tiroteios
que embalaram minha infância.
Talvez tenha sido a música alta
além do limite da dor.
Talvez.
Mas,
no íntimo
do meu coração absurdo,
cada mínimo detalhe da tua beleza,
toca-me
como um Sol em sinfonia.
quarta-feira, 16 de maio de 2007
Higiene
Escondia-se entre o pêlo e a pele.
Fugia da lâmina.
Fingia-se morto.
Aqui está ele: vermelho.
Fosse eu mais cuidadoso nunca o teria achado.
Mas não sou.
Chego a apaixonar-me três vezes no mesmo dia.
Às vezes, deixo crescerem florestas para ocultá-los.
Tenho pena.
Mas é preciso cortar e cortar.
Polir o rosto diante do espelho.
Caçá-los em todos os cantos.
E cuspir.
(Exigem-me a máscara lisa, sem cicatrizes)
Os mais higiênicos ainda os engolem em sorrisos suaves.
Eu não.
Eu sou sujo.
Nunca limpo a esperança agarrada entre os dentes.
segunda-feira, 7 de maio de 2007
Ressaca
Deve ter alguma coisa a ver com o que o patrão fala.
Deve ter alguma coisa a ver com o que eu preciso fazer.
Deve ter alguma coisa a ver com o que eu faço todos os dias.
Deve ter alguma coisa a ver com o gosto estranho na minha boca.
Deve ter alguma coisa a ver com a dor de cabeça.
Deve ter alguma coisa a ver com o gosto do beijo que eu não lembro.
Deve ter alguma coisa a ver com aqueles versos.
Deve ter alguma coisa a ver com alguma coisa que pareça algum amor.
Deve ter alguma coisa que eu não consigo esquecer.
sexta-feira, 4 de maio de 2007
O Segredo do Sol
Às oito horas, em ponto, a Rádio Saara toca o Hino Nacional. Qual o endereço das Casas Pedro? Atrasado. A cabeça ainda carrega os copos largados pela metade. Cada cantinho macio ou não parece uma cama. O sapato apressado: Tec-toc. Cadê o crachá?
Todos os dias ele toma nas mãos seu velho chapéu de palha e gira continuamente sob o sol. Faz isso para salvar o mundo.
Vinte e quatro anos. Mês que vem. Tão cedo. Nessa idade as pessoas ainda deviam sonhar. Boa parte das que amava está morta. Os outros vão morrer mais cedo ou mais tarde. Mais cedo. Ele também. O fígado já reclama aposentadoria. Mais trinta anos? Profissão errada. Úlcera certa.
Todos os dias ele toma nas mãos seu velho chapéu de palha e gira continuamente sob o sol. Faz isso para expulsar os demônios.
Vinte e quatro anos. Ele já sabe que não será presidente da república, artista famoso, jogador de futebol. A coluna já dói. O fôlego diminui. Talvez tenha sido. O quê? Só talvez mesmo. Mas continua. Até que.
Todos os dias ele toma nas mãos seu velho chapéu de palha e gira continuamente sob o sol. Faz isso porque não pode parar.
Vinte e quatro anos. Vinte e quatro horas para o fim-de-semana. Fds. Foda-se a folha de ponto. O Estado deveria garantir uma vida sexual decente a todos os cidadãos. Praça Tiradentes? É privada. O trabalho é público. Mas no sebo da praça há línguas estranhas.
Todos os dias ele toma nas mãos seu velho chapéu de palha e gira continuamente sob o sol. Faz isso para vender chapéus.
Vinte e quatro anos. Trezentos e sessenta graus: o cara do chapéu em cima do viaduto. A catedral. O sol se pondo. O retorno. A cabeça querendo cair do pescoço. Queria perguntar por que ele sempre faz aquilo.
Todos os dias ele toma nas mãos seu velho chapéu de palha e gira continuamente sob o sol. Faz isso para pedir perdão.
Vinte e quatro anos. Tanto desejo. E ele só precisava de um chapéu. Ali vende-se de tudo. Talvez ainda encontre o que perdeu. Talvez ainda haja esperança entre as canetas chinesas. Um chapéu. Atrasado?
Todos os dias ele toma nas mãos seu velho chapéu de palha e gira continuamente sob o sol. Só revelará a verdade no dia do juízo final.
Às oito horas, em ponto, a Rádio Saara toca o Hino Nacional.
quarta-feira, 2 de maio de 2007
Lu Longarez
"É a serenidade na frente da corda da forca.
É a forca.
É a força.
É a fragilidade."
(Lu Longarez)
Texto completo em http://lulongarez.blogspot.com/2007/02/forca-fora.html
terça-feira, 1 de maio de 2007
Magical Formulae
(Joyce Kilmer)
But fools are Gods within Poetry
God is made as He makes a tree
And the tree always tastes
What He whises to be
And every man can everywhere see
Gods in fake leaves
Made by fools like me
If words are leaves (and they can indeed be)
Then there's no God, no fool, just the Poem-Tree
quarta-feira, 25 de abril de 2007
Voltas
são caminhos apenas
sem espinhos às vezes
são esperas serenas
são espinhos às vezes
as mulheres morenas
sem caminhos às vezes
são muralhas apenas
se caminho às vezes
tuas curvas externas
sou espinho às vezes
nos espaços e pernas
teus espinhos às vezes
são caminhos apenas
para a volta das pernas
minhas, tuas, mil vezes
quarta-feira, 18 de abril de 2007
I tuoi occhi non sono parole
Poema Suplicante
Me fala, que eu quero.
Quero acordar nos teus dedos.
Quero amadurecer no teu olhar.
Quero habitar na tua espinha.
Quero flutuar nos teus pulmões.
Me fala.
Quero crescer na tua língua.
Quero surgir na tua garganta.
Quero evaporar nos teus lábios.
Quero ecoar nos teus cabelos.
Me fala.
Quero eriçar-me nos teus pêlos.
Quero arfar-me no teu seio.
Quero orvalhar-me nos teus olhos.
Quero amar-me no teu corpo.
Me fala.
Me fala, que eu quero nascer.
segunda-feira, 16 de abril de 2007
Retrato
Geme, generosa, minha dor.
E nesse exercício de espelho.
Seus lábios elaboram minha imagem.
sexta-feira, 13 de abril de 2007
quinta-feira, 12 de abril de 2007
Discussão Filosófica Interesante
Respostas a perguntas feitas pelo autor deste blog e outros comentadores:
ACONTECIMENTOS: A Controvérsia do Multiculturalismo
ACONTECIMENTOS: Comentário de Lucas e resposta a ele
ACONTECIMENTOS: Comentários de Ana e de Paulo de Toledo e resposta
Promessa
o beijo fictício de teus olhos.
Nem o confesso.
Todas as escolhas são felizes.
Os últimos, serão os primeiros.
Nosso amor será a vírgula indevida.
quarta-feira, 11 de abril de 2007
Quadra
A boca nunca dirá.
Se o diz, pressinto que mente.
Se o sinto, faz-me calar.
quarta-feira, 21 de março de 2007
Soneto
a beleza distante, o teu silêncio.
coagula-se o sangue,
a palavra lembrada.
e a murmurada
queima o lábio, exala
odores, e ardores, e incensos
como a pira funerária.
evapora-se o som.
mistério perdido, o tempo.
emparedada, a frase.
só há espaço
para o verso quebrado
onde o amor é diluido na crase
domingo, 18 de março de 2007
Elogio
Buscar cuidadosamente uma pequena beleza.
E ainda ser capaz de surpreender-se ao encontrá-la.
As mais escondidas valem mais pontos,
as que nunca foram achadas;
as óbvias, mas não notadas;
as impossíveis.
As fáceis também tem seu valor:
Nenhuma maravilha é completa
sem ser dita.
Por isso o prazer do elogio:
para participar da beleza do outro.
Para criá-la.
Para roubá-la aos olhos do mundo.
Por isso escrevo poemas:
para também sentir-me belo.
quarta-feira, 14 de março de 2007
Pálpebra
Para que me olhes.
Para que eu te oculte.
Para que tua humidade se condense sob meu abraço.
Meu alfabeto de gotas.
Por isso minhas palavras são frágeis.
Para que teu sorriso as estilhace.