quarta-feira, 18 de junho de 2008

Novo Endereço

Amigos,

Obrigado pela presença ao longo da vida deste blog, pela leitura atenta aos meus textos e pelos comentários diversos. Estou aposentando (ou dando novas férias) a este espaço. Em seu lugar, um novo blog - PROMESSAS PROVISÓRIAS - entra em atividade, com uma proposta um pouco diferente: não postarei apenas textos meus, mas também poemas de que goste, traduções minhas e de outras pessoas, resenhas, entrevistas etc. Espero vocês lá!

um abraço,
lucas

PROMESSAS PROVISÓRIAS

segunda-feira, 14 de abril de 2008

enjambement

em que difere
um olhar de um
olhar?

a atração gravitacional da tecla
enter

ou o cansaço dos calos dos dedos?

a gente já discutiu mil vezes mas não chegamos
nunca à resposta

você arriscaria uma aposta?

só sei que na síncope da dança dos pés dos seus versos
há algo da nudez breve
de um corpo

que escreve

terça-feira, 25 de março de 2008

Varal

Morena, minha morena
Tira a roupa da janela
Que vendo a roupa sem dona
Penso na dona sem ela

(quadra popular portuguesa)



fui eu quem fez o poema

mas quem vai vesti-lo
se está tão bem costurado
que não resta um único buraco
por onde passe um pescoço?

fruta sem caroço
ovo gorado
revólver sem bala
espada sem empunhadura

amor sem amor
que perdura
perdido do corpo

poema do nada
lindo e terrível
gemido da alma
penada

velha roupa colorida
flutuando no espaço
dessa eternidade
encolhida

é isso que me espanta:
com tanta roupa
e pouca garganta
a corda já fica pequena

quem vai vestir o poema?

sexta-feira, 14 de dezembro de 2007

Férias

Caros leitores,

Estou tirando férias por tempo indeterminado.
Então não esperem atualizações tão cedo.

Para qualquer contato: lucasnicolato@gmail.com

um abraço,
Lucas

terça-feira, 4 de dezembro de 2007

Procura-se compositor

Procuro músico com melodias para serem letradas.
Ou quem queira musicar meus poemas.
Se estiverem interessados, comentem esse post.

quinta-feira, 8 de novembro de 2007

Viaduto do Caju

a vida dividida
(ônibus entre dois sonos)
brevemente despertada
pelo ruído atômico
quase com espanto
vê da janela um sonho
e cabe inteira
na gentileza do
intervalo

segunda-feira, 29 de outubro de 2007

Realidade Palpável

O corpo nunca mente
a inescapável
possibilidade
dos lábios

Mas a promessa
só é sincera
se a verdade
é adiada

O olho chama
A alma cama

O corpo apenas semente

domingo, 21 de outubro de 2007

Corrida

Eu não tava preparado pra aquilo. Acho que ninguém estaria. Talvez algumas pessoas pudessem até encarar com certa naturalidade uma coisa daquelas. Mas não alguém como eu.

Minha vida sempre foi simples, ou melhor, sempre foi complicada, mas com complicações previsíveis, rotineiras. Em outras palavras, uma vida simples. Vez por outra o pneu do carro furava, ou algum moleque arranhava a lataria. Já havia sido assaltado duas vezes, número até pequeno na minha profissão. Às vezes brigava com minha esposa, mas sempre voltávamos. Às vezes eu jogava na loteria. Não ganhava nunca.

Era basicamente isso, vida simples. Isso e vagar de carro pela noite, pelas ruas da Zona Sul, esperando um casal de jovens na porta do cinema, ou uma senhora idosa que voltasse da visita aos netos. Às vezes um filhinho de papai cheio de uísque. Uma vez uma loira linda tinha dado sinal. Passei a corrida observando o decote pelo retrovisor. Bati. Foi uma merda. Às vezes quando chegava em casa de madrugada, exausto, ainda tinha disposição para fazer amor com a Carla. Esse tipo de coisa acontecia, vida simples, mas nada como o que aconteceu naquela noite.

Esqueci de falar de uma coisa que acontecia muito, principalmente em Janeiro. Chuva. Muita. Era uma merda maior do que bater por causa de decote de loira linda. Não dava pra andar. Quando começava cedo eu nem saía de casa. Sem corrida. Mas quando ela tava meio fraca eu arriscava, afinal, tinha aluguel pra pagar. Aí eu caia na armadilha, ficava preso no trânsito do Jardim Botânico ou alagado em Botafogo. Não ganhava uma corrida. Naquela noite maldita também estava chovendo, mas a corrida apareceu.

Passei em frente a um lugar desses, que a juventude gosta de freqüentar, onde eles bebem demais pra dirigir e tem medo demais pra andar a pé, onde as corridas são curtas e eu posso voltar rapidinho e pegar mais uma leva de adolescente chato. O problema é quando vomitam. Aí tem que mandar lavar, pagar caro, merda. Sempre discuto quando eles vomitam, fico estressado, a pressão sobe. É uma merda, é pior do que quando chove. Deixa pra lá! Naquela noite ninguém vomitou no meu banco.

A corrida foi de um cara alinhado, todo bem vestido, terno preto. Meio coroa, lá pelos cinqüenta. Sei lá. O importante é que o cara não era um adolescente filho de papai, nem o pai de um deles. Ou talvez fosse, tanto faz. O que é mesmo importante é que eu percebi exatamente o que ele era no momento em que o vi. Não me pergunte como um cara como eu pode reconhecer algo assim. Vai ver eu não sabia. O que eu estou dizendo? Eu sabia, só não quis aceitar o fato. Era só uma corrida, ia acabar rápido. Eu fiquei olhando o sujeito pelo retrovisor, mas ele não tinha decote, nem peitos bonitos que me fizessem salivar, só tinha aquele olhar sinistro, os cabelos grisalhos e um sorrisinho escroto.

Naquela época ainda não tinha esses rádios que avisam a gente das corridas. Se tivesse rádio era capaz de eu conseguir me distrair e levar numa boa. Talvez. Talvez tenha gente que consiga encarar esse tipo de coisa com naturalidade, mas eu fiquei ali, com um olho na pista e outro no sorrisinho, andando de vagar, no meio da chuva.

- Boa noite.
- Boa noite.
- Pra onde?
- Você sabe.

Continuei guiando. Foi aí que o cara resolveu abrir o paletó e tirou um maço de cigarros do bolso. É uma merda quando alguém fuma no carro. Fica o cheiro. Eu sempre fico nervoso quando alguém insiste em fumar no carro. Paro. A pressão sobe. Uma merda. Mas naquela noite eu não falei nada. Eu sabia o que ele era e não queria me meter, só queria acabar a corrida numa boa, pegar meu dinheiro e ir pra casa.

Às vezes penso que eu devia ter falado alguma coisa, parado o carro, deixado a pressão subir. Mas um cara como eu não sabe o que fazer numa situação dessas. O que você faria no meu lugar? É uma merda, mas sei lá. Acho que eu tinha que seguir em frente, acelerar e terminar a corrida. É o que eu sempre faço.

E fiz. Fui dirigindo no meio da água, desanimado com a chuva, nervoso com o sorrisinho e sem querer acreditar no que era aquele cara. Mas acreditando assim mesmo. Eu só queria fingir que não sabia. Minha vida era simples, e eu nunca soube muita coisa. Então segui até ficar parado no trânsito, como sempre acontecia quando chovia. Quem dera ter uma loira gostosa exibindo os seios e os lábios carnudos no banco de trás. Ah! Eu ficaria horas parado na chuva. Delirando. Mas só tinha fumaça pra respirar, e o sorrisinho pra ver. Tentei me distrair com a cruz pendurada no retrovisor, ela balançava pra lá e pra cá. Ainda a mantinha lá, mas não acreditava mais. Não acreditava, mas sabia o que era, sempre soube. Não deu pra distrair grande coisa.

- Vira ali.
- Mas ali não tem saída.
- Vira.
- Tá.

Virei, não queria discutir. Às vezes acho que não devia ter virado. Sei lá, podia ter falado forte. Mas aí a pressão ia subir, eu ia ficar estressado. Ia ser uma merda. E eu não queria discutir. Eu sabia o que ele era. Um cara como eu não sabe como lidar com isso, entende?

Pegamos um atalho e fomos parar no túnel. Atravessei tossindo com a fumaça e vendo o sorrisinho que brilhava no meio da escuridão. Eu sempre atravessava o túnel. Sempre ficava meio nervoso com aquele negócio fechado e escuro. Às vezes eu dava uma volta passando pelo Centro só pra não passar por túnel. Era uma merda. Mas aquela noite eu peguei o túnel e não fiquei nervoso com isso.

Cheguei em casa de madrugada. Ainda tava com disposição pra trepar com a Carla. Às vezes acontecia. Subi e fui pro quarto. O cara do sorrisinho ficou gargalhando enquanto eu fodia bem gostoso aquela vagabunda. Eu sabia o que ele era, sempre soube, e nele eu não deixei de acreditar. Depois que eu me fartei, foi a vez dele. Ele foi na cozinha e pegou uma faca de churrasco. Foi uma merda.

Hoje eu tenho uma vida simples outra vez. Ou melhor, complicada, mas com complicações previsíveis, rotineiras. Ou seja, vida simples. Às vezes os camaradas aqui fazem uma bagunça e queimam uns colchões. Às vezes reclamo, e sempre me arrependo. Às vezes tento sair, mas nunca consigo. É isso, uma vida simples. Isso e me arrastar à noite entre os corpos prensados dos meus colegas de cubículo, ouvindo gargalhadas e vendo o sorrisinho escroto em cada rosto semi-adormecido. Uma vez, veio uma loira linda visitar um colega, e eu fiquei olhando aquele decote. Levei um soco, foi uma merda. Às vezes, enquanto espero minha vez de dormir, de madrugada, ainda sinto saudade de fazer amor com a Carla. Essas coisas acontecem, vida simples. Mas nada como naquela noite.

quarta-feira, 17 de outubro de 2007

Tertúlia

No próximo dia 29 acontecerá a "Tertúlia" - evento literario
com 6 poetas convidados - no Campus Niterói da Unversidade
Estácio de Sá. O acontecimento propõe-se a apresentar novos
autores ao público universitário.
Eu estarei lá, como parte da organização do evento e dois
dos meus livretos "Fragilidade", contendo textos selecionados
deste blog, serão sorteados à platéia.
A última edição do evento contou com a presença de jovens
talentos como George Orteyga e André Vargas.

Tertúlia
29/10 - 20:20
Universidade Estácio de Sá
Campus Niterói - Bloco B - Sala Multimídia
Rua Eduardo Luiz Gomes, 134 - Centro - Niterói

sexta-feira, 28 de setembro de 2007

Metroblogging Rio

Amigos,

Estou colaborando com o blog "Metroblogging Rio" também.

Vejam meus posts no endereço:

http://rio.metblogs.com

Mas não esqueceri deste aqui. Em breve, novos poemas em verso e prosa.


um abraço,
Lucas

quinta-feira, 27 de setembro de 2007

Laura Loura



A parte mais sexual do corpo de uma mulher é o nome. Pelo desejo, algumas se reduzem a apenas isso. Ela. Sussurrada entre sonhos. A língua toca suave entre as vogais. Repete-se, com pequenas variações, até o orgasmo. Deveria haver normas rígidas sobre a escolha de nomes para o sexo feminino. Nunca seria capaz de amar uma mulher sem a letra ele. Lúcia, Helena, Lorena, Paula, Leonora, Clarice. Jamais Ana Maria.
Propus-me a contar. Minha mente profundamente libidinosa exige a história de uma mulher linda e trágica. Tentei-me com Lolitas seqüestradas, mas meu lápis não desliza em folhas gastas. Busquei perfumes e enredei-me no ouro de louros cachos. Achei. Laura. Apaixonei-me pelo erre gratuito. Perdi-me no olhar dos dois as verdes. O da esquerda me pisca de leve e quase se fecha. Laura, Laura, Laura. Esqueço-me nas pronúncias até que e o som já não sai de minha boca. Sou apenas papel beijado pelo grafite.
Laura sou eu.

* * *

Nasci antes que a cidade na qual. Altos de montanha friozinho neblina. Ás vezes eu era. Certa vez me fui. Nem pai nem mãe nem avô, que beijei de má vontade e já não. Tenho a pele muito branca e nunca havia visto oceano. O Sol me espiava o tornozelo como se eu fosse mais que um poema. Mas Copacabana. Escondi meus sonhos em lençóis alugados. Pus cordas em meu pescoço. Acordei. Ardia. A Música. Amei.

* * *

Laura L., cantora e compositora, nasceu em agosto de 1980 em uma pequena cidade serrana do estado do Rio de Janeiro. Aos dezessete anos de idade deixou a casa de seus pais para viver na Cidade Maravilhosa, onde começou a trabalhar como camareira, a cursar a faculdade de Comunicação Social e a apresentar-se em bares e casas noturnas. Entre suas composições mais apreciadas pelo público estão: “O meu nome é esse”, “Meu amor distante” e “Tua voz”. Faleceu no último domingo, aos 26 anos, em decorrência de ferimentos sofridos no incêndio criminoso do ônibus em que viajava para sua cidade natal.

* * *

Quando olhei aquilo. Foi ai que. Foi naquela coisa que enxerguei. Ela. E não era. Lágrimas correndo até meus lábios. O pretume não me enganou. Aquele pretume tão preto que parecia o preto do carvão preto. Porque era. Mas ainda queimava alguma brasa branca. Por algum tempo. A Laura era loura como a cerveja que a gente tomava. E eu adorava a doçura da cabeleira dourada. Mas Laura era amarga, mesmo na cara branca feito espuma. E a espuma se desfaz uma hora. A brasa apaga. Tudo finda. Laura loura, que queria ser preta, acabou sendo só cinzas.

* * *

A primeira vez que a vi. Laura. Loura, ali na Lapa, cantando ao lado do lixo. Achei linda. E aquela voz. Na voz eu via meu vazio. Mas ela me enchia, me achava, me inchava o ego quando me elogiava. Eu explodia com seu canto. Mas quando ela gozava, eu não gostava do grito. Saiu de minha casa, e ainda morou na gaveta da escrivaninha, onde eu lia e relia, e ela era só minha. Até que.


* * *

E se ela ler a notícia? Vai continuar a vida, tudo igual, fingir que não é com ela? Ou se vinga, olho por olho, me mata, joga no lixo, me usa pra limpar merda de bicho? Laura loura queria ser preta, mas eu a deixei marrom. Na imprensa. E ela nem pensa em me procurar.

* * *

Tragédia Carioca: ex-namorado chifrado põe fogo em ônibus e mata cantora. Há testemunhas, mas eu matei todas. Não. Eu sou todas. Eu sou Laura. Sou linda. Sou o filho da puta do ex-namorado. Podem me prender. Não. Tenho direitos. Não à noite. Tenho o direito de botar fogo nesse apartamento. Eu quero ser preta, mais preta que aquela voz linda. Quero ser negra igual ao carvão. Quero o amarelo do fogo nos meus cabelos. Quero ser rubro-negro. Branco azedo.
Mas Laura, a essa altura, deve trabalhar em um Cassino em Nevada e nunca saberá como morremos.

* * *
Só eu que vi. E só vejo o que quero. Madrugada. Só eu naquele lugarzinho. Ouvindo o grito. O cabelo preto ficou amarelo igual ao dela. Da Laura. Só que cheirava mal. Mas chorei de emoção assim mesmo. Ninguém vai querer saber de nada. Ninguém acredita em acidentes. Só eu que vi. E todo mundo só vai ver o que eu quero. E preto não tem nome.

* * *

Sou só papel beijado pelo grafite. Rasgo negro aderindo ao branco. Eu morava dentro daquela gaveta. Ás vezes abria pra me olhar de perto. E via que era ela. Até que. Assisti a gente queimando na lixeira do escritório. O amarelo brilhante ao redor do nosso abraço retorcido e apertado. O branco beijado pelo lábio vermelho. Até que não havia limite entre a letra e a pele.
Foi ai que. Foi naquela coisa que enxerguei. A Laura jogada no chão. No papel sujo. Pisada, usada pra limpar, embrulhar, queimar. Habitando os becos e as piores bocas. Só assim posso salvá-la. Libertá-la. Só se eu queimar nossos corpos no povo.

* * *

Laura, Laura, Laura. Repete-se, com pequenas variações, até o desespero. Nunca amaria uma mulher sem a letra ele. Ele sou eu.

* * *

Acabei indo. Nem disse. Só pra ele. Contei da partida no pedaço de papel. Adivinhei dúvidas. Então, diz que morri. Cresci antes que a cidade na qual. Renasci antes que ela morresse. Cantando ao lado do lixo. O olhar fixo no rapaz assustado. Sempre esqueço depois de lembrar que.
Dia desses li nossa morte. Ele cumpriu. Li e calei. E sorri. Nem pai, nem mãe, nem avô, nem ex-namorado. Nem polícia. E a notícia distante, feito o fogo brilhante, escureceu minha pele. Arde. Arte em minhas veias. Sereia que sou. Só canto. E o corpo impossível. Aqui não sou mais que um poema. Invisível. Nunca quis ser loura, nem Laura. Nem preta. Não sobraram cordas. Nada mais me ata. Só ele é que era nós.

sexta-feira, 3 de agosto de 2007

Livre

A gata me ganha,
arranha, se esfrega,
se entranha
na minha vida,
mas lambe a pata,
esquecida, e nega:
dorme quase sozinha
no nosso abraço
sem nome.